Levada ilegalmente para a Rússia, uma prisioneira de guerra desafia Putin
Trancafiada numa jaula em Moscou, a mulher-esqueleto gargalha. Ainda com o rosto escavado por uma greve de fome que durou 83 dias, encerrada em março, a tenente ucraniana Nadia Savchenko, de 33 anos, riu da previsibilidade da decisão da corte russa de estender sua prisão preventiva até 30 de junho. Nadia é acusada de ter contribuído para a morte de dois jornalistas russos que cobriam o conflito separatista no leste ucraniano, em junho do ano passado. As provas apresentadas pelos promotores são mesmo de dar risada. Uma delas é o depoimento de um prisioneiro ucraniano que disse ter visto a tenente falando ao celular um pouco antes de um morteiro atingir os jornalistas. Posteriormente, porém, o soldado negou a informação e disse que foi interrogado ferido e sob ameaça de tortura. A outra “prova” consiste no testemunho de rebeldes separatistas anônimos. Nadia já era uma celebridade antes de a Rússia iniciar uma guerra por procuração em seu país, em 2013. Foi a única mulher do Exército ucraniano a lutar sob o comando da Otan no Iraque, o que lhe deu argumentos para receber treinamento para piloto militar, uma função antes exclusiva de homens. Em 2014, pediu licença da Força Aérea e alistou-se como voluntária para lutar em um batalhão da Guarda Nacional contra os separatistas. Um vídeo na internet que a mostra algemada a um cano de ferro e respondendo com insolência ao interrogatório de seus captores transformou-a em heroína na Ucrânia, a ponto de ela ter sido eleita parlamentar sem sair da prisão. Seu julgamento é um número político no show de horrores em que o governo de Vladimir Putin converteu o sistema judiciário russo.
Diogo Schelp