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Brasil precisa dar mais apoio político à Ucrânia - entrevista do Ministro das Relações Exteriores da Ucrânia ao jornal "Folha de São Paulo"
14 novembro 2014 20:53

Chanceler questiona falta de crítica à Rússia e diz que iItamaraty perde prestígio global por não defender valores democráticos

LEANDRO COLONDE LONDRES

O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Pavlo Klimkin, 46, afirma que espera "mais apoio político do Brasil" no conflito com separatistas pró-Rússia no leste do país.

Em entrevista por e-mail à Folha, Klimkin disse confiar que os valores "democráticos" para o Brasil são tão "importantes" quanto os seus "interesses econômicos".

A afirmação é uma possível referência às ligações do governo brasileiro com o russo, sobretudo no Brics, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

Klimkin, que assumiu em junho a diplomacia ucraniana, deixou claro a insatisfação com a neutralidade brasileira na resolução da ONU contra a anexação da península ucraniana da Crimeia pela Rússia neste ano.

"Estaríamos mais felizes em ver o país [Brasil] na lista daqueles que apoiaram a resolução", afirmou.

O ministro buscou ainda justificar a dificuldade em cumprir o cessar-fogo anunciado em setembro e em retomar territórios ocupados por separatistas, que ele chama de "terroristas".

Folha - O cessar-fogo tem se mostrado frágil. Como acreditar em paz na Ucrânia?

Pavlo Klimkin - Infelizmente, desde o cessar-fogo, mais de cem soldados ucranianos foram assassinados. A situação está longe de ser pacífica. Nossas forças estão sob o fogo dos terroristas e, claro, em alguns casos precisam revidar. As forças ucranianas estão prontas para defender nosso país, mas nossa busca é pela paz e para salvar vidas dos dois lados.

Os separatistas declararam independência e controlam áreas estratégicas. Por que é tão difícil retomar territórios?

Nosso princípio básico é evitar baixas entre os civis. Nós não estamos dispostos a combater os ataques de terroristas em áreas residenciais. Eles sabem disso e focam exatamente nesses lugares.

Não precisamos atingir objetivos militares a qualquer preço.

No curto prazo, temos de atingir o real cessar-fogo e implementar o que foi acertado. Depois, restaurar a integridade territorial da Ucrânia e chegar a um acordo sobre os princípios de descentralização para oferecer mais poderes às regiões e recuperar o leste do país.

O Brasil foi criticado pela neutralidade na resolução da ONU contra a anexação da Crimeia pela Rússia. Havia alguma expectativa de que o país condenaria a Rússia?

Somos gratos ao Brasil por não reconhecer a República da Crimeia como parte da Rússia, embora, é claro, estaríamos mais felizes em ver o país na lista daqueles que apoiaram a resolução das Nações Unidas.

O Brasil é um ator essencial em termos globais, e acho que o governo brasileiro sabe que o apoio à independência, à soberania e à integridade territorial dos países é o princípio fundamental da segurança e da estabilidade global. Neste sentido, nós definitivamente precisamos de mais apoio político do Brasil como nosso parceiro estratégico e um aspirante a membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.

Qual sua opinião sobre essa posição do Brasil?

O Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer a independência da Ucrânia, em 1991, e agora precisamos do seu apoio para defendê-la.

Eu estou profundamente confiante de que os valores democráticos são tão importantes para o Brasil quanto os seus interesses econômicos.

A maior e mais consagrada democracia da América Latina conseguiria mais benefícios e mais prestígio, incluindo dentro do Brics, se apoiasse esses valores.

A Ucrânia está cooperando com o Brasil em campos estratégicos, como o projeto do foguete de Alcântara, no qual nós não só vendemos nossa tecnologia mas também dividimos conhecimento com especialistas brasileiros. Dez deles receberam aprendizado na Ucrânia.

O mesmo se dá com relação à tecnologia de insulina, a qual oferecemos para o governo brasileiro para o país produzir a sua própria insulina em vez de precisar importá-la.

A recente eleição parlamentar na Ucrânia foi vencida por uma maioria pró-União Europeia. Isso vai ajudar o país a entrar para o bloco?

O nosso objetivo de nos transformarmos em membro da UE permanece. A ideia de uma integração europeia conta com apoio integral na sociedade ucraniana e também se refletiu nas eleições parlamentares. O acordo de cooperação assinado neste ano é um passo muito importante. Depois de implementado, esperamos pedir adesão à UE em 2020.

Recentemente, a Rússia concordou em manter o fornecimento de gás à Ucrânia num acordo apoiado pela UE. Esse acordo pode ter algum impacto na crise militar?

Talvez mais simbólico do que prático. As negociações demonstraram que, apesar das discordâncias, Rússia e Ucrânia estão aptas a chegar a um acordo temporário através da UE. Agora, juntos, temos que atingir e implementar uma solução para o leste da Ucrânia.

Excluindo a questão do gás, como a economia da Ucrânia tem sido afetada pela crise?

Donetsk e Lugansk são regiões industriais altamente populosas. Por causa do conflito, a maioria dos seus negócios fechou ou suspendeu os trabalhos. Essa situação tem tido dramáticas consequências para os cidadãos. Outras regiões estão sofrendo economicamente. Apesar disso, o governo vem implementando reformas, e estamos abertos a investidores, com exceção da área de conflitos.

Folha de São Paulo,

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